Texto: Paula Cabral de Menezes
Luz, câmera, ação! Nas era do digital e em tempos de selfies, todo mundo acha que fotografar é muito simples. Será?
Na era das selfies, compartilhamento de fotos de todos os tipos nas redes sociais e equipamentos digitais mais baratos, qualquer um acha que é fotógrafo. Após umas selfies, fotos mais interessantes e filminhos não tremidos, as pessoas que têm um pouco mais de interesse pela fotografia logo compram uma máquina digital. Em paralelo a isso, também decidem incluir o título de fotógrafo nos seus perfis e oferecer os seus serviços.
Mas, como ressalta o fotógrafo Rodrigo Sack, “com o digital, todo mundo acha que é fotógrafo. É claro que por conta dessa nova era surgiram bons fotógrafos, profissionais qualificados”. Rodrigo, que tem mais de 10 anos de experiência em fotografia de casamento, lembra que “por outro lado, como agora existem muito mais pessoas nesse mercado, também existem muito mais trabalhos sem qualidade”.
Lawrence Aszmann, que mantém a tradição – iniciada em 1930 – da Aszmann Fotografia, também já identificou esse novo tipo de “profissional”. “A pessoa compra uma câmera fotográfica e acha que é fotógrafo. Mas ele não tem uma curva de experiência, tempo de mercado, enfim, não tem o know how. Muitos só clicam, é só quantidade, sem qualidade”.
“O mercado mudou uma barbaridade”, diz Eduardo Ribas, terceira geração da empresa Ribas Foto e Vídeo. “Antes éramos meia dúzia de fotógrafos para casamentos e eventos. E realmente sabíamos o que estávamos fazendo. Hoje está muito mais fácil comprar um equipamento de qualidade, antes era complicado importar. Agora você encontra no mercado diversos equipamentos de primeira e de segunda mão, e pode dividir em 10, 12 vezes. Com isso, é fácil para o amador comprar um material básico e sair procurando trabalho”.
“Mas é só uma questão de tempo”, prevê Rodrigo. “Essas pessoas não vieram para ficar. Vieram só ganhar um dinheirinho e vão se queimar em menos de um ano”.
Mas ele não tem uma curva de experiência, tempo de mercado, enfim, não tem o know how. Muitos só clicam, é só quantidade, sem qualidade. (Lawrence Aszmann)
Muitos desses novos fotógrafos realmente estão somente em busca de um complemento de renda, como ressalta Victor Miguel, que aprendeu todos os truques com o seu pai, desde a época das máquinas analógicas. “Eu não tenho nada contra a entrada de novos fotógrafos. Agora eu sou contra quem entra pensando que é apenas uma opção de ganhar dinheiro, e não leva em consideração o mais importante, que é o sentimento do casamento”.
O principal é ter o máximo possível de indicações, conhecer os serviços que ele já prestou, conhecer o fotógrafo pessoalmente… (Eduardo Ribas)
Victor também destaca que a entrada de pessoas sem experiência tem mudado o perfil das fotos, que agora parecem trabalhos de fotojornalismo. “Tudo é muito midiático, estão mais preocupados com as redes sociais e postam fotos desses profissionais que seriam descartadas pelos que têm mais experiência. Na verdade, esse estilo de fotojornalismo jogou para baixo o padrão das fotos, deixou de lado o romantismo e também as fotos posadas, que exigem mais técnica”.
Essas pessoas não vieram para ficar. Vieram só ganhar um dinheirinho e vão se queimar em menos de um ano. (Rodrigo Sack)
PARA O BEM E PARA O MAL
Se por um lado a qualidade do trabalho desses novos fotógrafos vem sendo muito questionada, por outro lado essa “sacudida” no mercado pode até ser benéfica, desde que acompanhada de muita responsabilidade.
Segundo Renata Xavier, que começou sua carreira como fotojornalista e hoje é uma premiada fotógrafa de casamentos, “o mercado da fotografia de casamento sempre foi muito competitivo e de alta rotatividade. Muitos fotógrafos entram e saem dele a cada ano. É uma profissão que impõe muita dedicação e entrega pois, além de muitas horas de trabalho no dia do casamento, tem todo um processo de pós-produção pesado de muitas horas, dias e até semanas de trabalho pós evento. É normal muitos entrarem e muitos saírem, mas alguns profissionais se apaixonam de tal maneira pelo desafio que seguem adiante. Sempre existe espaço para um olhar diferenciado e apaixonado pela profissão”!
Entretanto, somente um olhar diferenciado não compensa a inexperiência, como lembra Marina Fava, que há 7 anos encanta noivas. “Esses profissionais, que não passaram por um estágio, não têm experiência, e quando entram na cerimônia fazem uma lambança, uma bagunça. Ficam correndo de um lado para o outro,. Quando o fotógrafo e a equipe de filmagem ficam no desespero, correndo pra lá e pra cá, você pode ter certeza de que eles acabaram de entrar no mercado”.
Ficamos sabendo de muita coisa ruim que acontece. Gente que não entrega material, não entrega no prazo, perde cartão de memória. (Marina Fava)
Mas assim como Renata, Marina também enxerga alguns pontos positivos. “Muita gente que está entrando agora agrega, tem um olhar diferenciado, mais sensibilidade. Eu não sou contra novos profissionais entrarem no mercado, o maior problema é a conduta, se você pode confiar no prazo de entrega, saber que tudo será registado da forma que a noiva quer”.
TRABALHO QUASE INVISÍVEL
Por falar em conduta, fotógrafos e equipes de filmagem precisam estar presentes em todos os momentos da cerimônia, mas, ao mesmo tempo, precisam estar quase invisíveis. “Nós não devemos interagir muito com a cerimônia”, diz Lawrence. “É preciso estar em pontos específicos sem atrapalhar as pessoas. O fotógrafo tem que estar ali o tempo todo fotografando, mas sem se inserir no decorrer do evento. Isso é muito importante, não pode ocorrer nenhuma intervenção”.
Além dessa capacidade de participar da cerimônia sem interagir, existem outros detalhes que podem até parecer bobos, mas que são muito importantes quando se pensa no conjunto. Um deles é a apresentação. Com a experiência, o fotógrafo sabe como se portar numa cerimônia e até mesmo como se vestir, dependendo do local e estilo.
“O pessoal vai muito mal vestido. Eu falo sempre que o casamento é o dia especial da vida da pessoa. Aí de repente vai um cara mal vestido, mal-ajambrado”, ressalta Rodrigo, lembrando que “estive em um casamento e o responsável pelo vídeo, por exemplo, estava de calças jeans e um sapato vermelho, numa cerimônia chiquérrima. Eu acho falta de cavalheirismo. E isso acontece com frequência”.
Eduardo vai além das roupas e diz que muita gente “não tem mesmo é educação. Não sabem como se dirigir às pessoas, a um cliente. Naquela hora, ele é o meu patrão. Por mais intimidade que o cliente te dê, você tem que mostrar que ele é que manda. O fotógrafo não pode se sentir o dono da festa”.
Mas pode atuar como um psicólogo, diz Victor. “Muitas pessoas dizem que além de fotógrafo, eu também sou psicólogo. O único que não pode ficar nervoso sou eu. Eu preciso estar calmo e saber contornar problemas”.
CERCANDO POR TODOS OS LADOS
A que pontos as noivas devem estar atentas para não entrarem em uma furada? Indicação é o maior trunfo das noivas, destacam todos os fotógrafos.
“O principal é ter o máximo possível de indicações, conhecer os serviços que ele já prestou, conhecer o fotógrafo pessoalmente e também o seu ambiente de trabalho – se ele tem escritório ou está perdido por aí”, diz Eduardo.
Lawrence também destaca a questão da estrutura, o local onde ficam os equipamentos, onde será realizada a reunião. “Se for em casa, ele precisa ter um endereço fixo. Tudo isso é questão de segurança, já que o dia do casamento não volta”.
Além da referência, Marina garante a sua segurança e a das noivas com um contrato bem detalhado. “Isso preserva as duas partes. Um contrato deve determinar a que horas eu devo chegar, o que tenho que levar até a fase de pós-evento, com prazo de entrega e como funciona a devolução do material”.
A noiva também deve pesquisar se o fotógrafo e o estúdio estão respondendo a processos. “A base é essa”, diz Eduardo”. “É ter um nome conceituado no mercado, um nome limpo, o que vale para todos os fornecedores envolvidos no casamento”.
E muitos não têm o nome limpo. “Tem um monte de gente nova com o nome no Reclame Aqui. Tem até o caso de uma empresa formada pelo marido e a mulher e, quando eles se separaram, um deles sumiu com todo o material”, conta Victor.
FUJA DA INTERNET
“A última coisa que a noiva deve olhar na hora de contratar a fotografia é o Instagram do fotógrafo”, alerta Rodrigo. “Você faz o quiser, como fazer um casamento à distância. O fotógrafo passa perto de um casamento, tira uma foto e posta dizendo ‘lindo casamento que aconteceu ontem’. Mas ele não era o responsável pelo trabalho. E nós sabemos que fazer uma, 10 ou 15 fotos bonitas é mole, mas quero ver 2 mil fotos bonitas, que é o que a gente entrega”.
E tem “fotógrafo” que chega até a publicar como suas as fotos de sites internacionais e também as de profissionais brasileiros. Eduardo diz que já encontrou muitas imagens da Ribas Foto e Vídeo publicadas em sites de outros fotógrafos, na base do “copy & paste”. “É uma comédia”, diz ele.
O mercado da fotografia de casamento sempre foi muito competitivo e de alta rotatividade… É uma profissão que impõe muita dedicação e entrega (Renata Xavier)
UM ERRO QUE NÃO TEM VOLTA
Infelizmente, as histórias tristes são frequentes, como conta Marina. Eu fico chateada porque ficamos sabendo de muita coisa ruim. Gente que não entrega material, não entrega no prazo, perde cartão de memória. As vezes o cerimonial chega a me ligar e perguntar: ‘Isso pode acontecer (perder o cartão)? O que eu faço?’ Eu digo que isso pode acontecer, mas é muita falta de cuidado, de experiência, é coisa de quem entra no mercado e não tem comprometimento”.
Renata garante que, ‘infelizmente sim” acontecem muitos problemas. “E aquele momento na vida das pessoas não se repete… Alguns casais já me procuraram para fazer fotos da gravidez, de família, festas de aniversário pois optaram por outros profissionais e não ficaram satisfeitos com o resultado. Já tive um caso de uma noiva que ficou tão triste com o fotógrafo que ela contratou que, ao completar 40 anos, fez uma nova festa de casamento (renovação de votos) no mesmo local só para que nós pudéssemos fotografar da maneira que ela sempre sonhou”.
Já Victor foi contratado para fotografar uma noiva cuja irmã havia casado há 2 meses e o pai das noivas fez questão de contar que as fotos do primeiro casamento pareciam um álbum de revista de show, com muitos registros de pessoas pulando, com copo na mão. “Mas ele só tinha duas fotos junto com a filha, uma saindo do carro e outra entrando na igreja. E com a mãe foi tirada apenas uma foto, durante a festa, quando ela, inclusive, já estava suada. Não tinha foto com a irmã, com madrinhas. No contrato estava estipulado que se a família quisesse fotos posadas eles mesmos deveriam reunir as pessoas. Esse é o estilo do fotojornalismo”.
…Preocupados com as redes sociais e postam fotos desses profissionais que seriam jogadas fora pelos que têm mais experiência. (Victor Miguel)
Algumas noivas até ficam sem fotógrafo no dia do casamento. Lawrence diz que já ouviu na internet muitos casos de noivas que pagaram e o fotógrafo sumiu. “São casos que a gente nem gosta de lembrar”.